Humanos viveram com neandertais por até 5 mil
FOLHA DE S.PAULO 2014
ciência
Humanos viveram com neandertais por até 5 mil anos, afirma pesquisa
REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
21/08/201422h40
Ainda não se sabe ao certo por que os neandertais se extinguiram, mas um novo estudo deixa uma coisa bastante clara: o triunfo do Homo sapiens sobre seus primos supostamente primitivos não foi um passeio. As duas espécies podem ter convivido por até 5.000 anos na Europa.
É como se o primeiro contato entre neandertais e ancestrais dos humanos modernos no continente tivesse acontecido antes da construção das primeiras pirâmides do Egito, enquanto o desaparecimento total deles ocorreria no ano passado.
"Imagino um cenário no qual havia pequenas populações dos dois grupos na Europa, com um declínio lento e constante dos neandertais conforme os humanos modernos iam aparecendo em maior número, com tecnologia mais sofisticada", disse à Folha Tom Higham, pesquisador da Universidade de Oxford (Reino Unido) e coordenador da pesquisa.
Higham e seus colegas também estão propondo uma "certidão de óbito" mais antiga para o Homo neanderthalensis. Há 39 mil anos, afirmam eles, todos teriam desaparecido --pesquisas anteriores indicavam que, na Espanha e Portugal, os neandertais poderiam ter resistido até uns 35 mil anos atrás.
As conclusões, publicadas na edição desta semana da revista "Nature", baseiam-se em avanços tecnológicos que melhoraram bastante a precisão das datações de achados arqueológicos, feitas com o método do carbono-14.
Tais datações são realizadas com base na presença de uma variante radioativa do elemento químico carbono em restos de matéria orgânica, como ossos e dentes.
Esse carbono-14 é incorporado naturalmente pelos seres vivos em seu organismo. Após a morte de plantas e animais, ele passa a se transformar em nitrogênio a uma taxa conhecida, o que permite calcular o tempo entre a morte e o momento presente.
Acontece que o cálculo é complicado --a matéria orgânica muito antiga pode acabar sendo contaminada com carbono "jovem", entre outros problemas.
A equipe dominou técnicas para contornar essas dificuldades e realizou uma batelada de novas datações, investigando amostras de 40 sítios europeus, de Gibraltar (sul da Espanha) à Rússia.
Os resultados mostraram não apenas que os neandertais teriam desaparecido mais cedo do que se imaginava como também sugerem que as primeiras tribos de humanos modernos já estavam por perto entre 5.400 anos e 2.600 anos antes do sumiço do Homo neanderthalensis.
É tempo mais do que suficiente não apenas para episódios de miscigenação (a comparação entre o DNA de pessoas de hoje e o de neandertais indica que, de fato, isso ocorreu) como também para intercâmbio cultural, defende Higham.
Esse seria um jeito de explicar a tradição arqueológica conhecida como chatelperroniense, encontrada na França. Os artefatos com esse estilo parecem ter sido feitos por neandertais, mas têm sofisticação similar à dos produzidos por humanos anatomicamente modernos. A ideia é que os neandertais teriam aprendido essa arte com nossos ancestrais.
A pesquisa, porém, já provoca controvérsia. O arqueólogo português João Zilhão, da Universidade de Barcelona, criticou as conclusões de Higham e companhia.
Ele questiona, entre outras coisas, a ideia da "aculturação" neandertal que teria gerado o chatelperroniense. Para ele, os neandertais teriam sido capazes de criar essa cultura sozinhos.
ciência
Humanos viveram com neandertais por até 5 mil anos, afirma pesquisa
REINALDO JOSÉ LOPES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
21/08/201422h40
Ainda não se sabe ao certo por que os neandertais se extinguiram, mas um novo estudo deixa uma coisa bastante clara: o triunfo do Homo sapiens sobre seus primos supostamente primitivos não foi um passeio. As duas espécies podem ter convivido por até 5.000 anos na Europa.
É como se o primeiro contato entre neandertais e ancestrais dos humanos modernos no continente tivesse acontecido antes da construção das primeiras pirâmides do Egito, enquanto o desaparecimento total deles ocorreria no ano passado.
"Imagino um cenário no qual havia pequenas populações dos dois grupos na Europa, com um declínio lento e constante dos neandertais conforme os humanos modernos iam aparecendo em maior número, com tecnologia mais sofisticada", disse à Folha Tom Higham, pesquisador da Universidade de Oxford (Reino Unido) e coordenador da pesquisa.
Higham e seus colegas também estão propondo uma "certidão de óbito" mais antiga para o Homo neanderthalensis. Há 39 mil anos, afirmam eles, todos teriam desaparecido --pesquisas anteriores indicavam que, na Espanha e Portugal, os neandertais poderiam ter resistido até uns 35 mil anos atrás.
As conclusões, publicadas na edição desta semana da revista "Nature", baseiam-se em avanços tecnológicos que melhoraram bastante a precisão das datações de achados arqueológicos, feitas com o método do carbono-14.
Tais datações são realizadas com base na presença de uma variante radioativa do elemento químico carbono em restos de matéria orgânica, como ossos e dentes.
Esse carbono-14 é incorporado naturalmente pelos seres vivos em seu organismo. Após a morte de plantas e animais, ele passa a se transformar em nitrogênio a uma taxa conhecida, o que permite calcular o tempo entre a morte e o momento presente.
Acontece que o cálculo é complicado --a matéria orgânica muito antiga pode acabar sendo contaminada com carbono "jovem", entre outros problemas.
A equipe dominou técnicas para contornar essas dificuldades e realizou uma batelada de novas datações, investigando amostras de 40 sítios europeus, de Gibraltar (sul da Espanha) à Rússia.
Os resultados mostraram não apenas que os neandertais teriam desaparecido mais cedo do que se imaginava como também sugerem que as primeiras tribos de humanos modernos já estavam por perto entre 5.400 anos e 2.600 anos antes do sumiço do Homo neanderthalensis.
É tempo mais do que suficiente não apenas para episódios de miscigenação (a comparação entre o DNA de pessoas de hoje e o de neandertais indica que, de fato, isso ocorreu) como também para intercâmbio cultural, defende Higham.
Esse seria um jeito de explicar a tradição arqueológica conhecida como chatelperroniense, encontrada na França. Os artefatos com esse estilo parecem ter sido feitos por neandertais, mas têm sofisticação similar à dos produzidos por humanos anatomicamente modernos. A ideia é que os neandertais teriam aprendido essa arte com nossos ancestrais.
A pesquisa, porém, já provoca controvérsia. O arqueólogo português João Zilhão, da Universidade de Barcelona, criticou as conclusões de Higham e companhia.
Ele questiona, entre outras coisas, a ideia da "aculturação" neandertal que teria gerado o chatelperroniense. Para ele, os neandertais teriam sido capazes de criar essa cultura sozinhos.
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